quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

para você que cruzou a porta...

 
eu aviso desde agora, tudo está bagunçado. a última vassoura se perdeu, os panos umedeceram com a última chuva e privados do sol de hoje os panos enfim todos mofaram. as duas brigaram novamente. mas antes de ontem, no mês passado, pareciam estar se amando. eu não sei, eu não vi direito. passei uma semana sentado na cadeira de balanço quebrado ao chão. a cadeira caída, feito meca, cama, maca. eu fiquei parado ali com a cabeça esbarrando ao chão. uma entrou pela porta, indo rumo a outra. a outra entrou pela mesma porta e a chamou. elas pararam, ambas embaixo das portas. se acontecesse um terremoto, só eu morreria, porque estava já no chão. elas não, sempre tiveram medo de terremoto, por isso lá em casa tem tanta porta. elas se olharam, debaixo das portas, voltaram velozes e bateram-se os peitos. ou seja, elas estão se amando outra vez. voltaram a se ver e a se respeitar. voltaram hoje, eu não sei, talvez amanhã, voltaram a se cuspir a se escarrar. está tudo bem aqui em casa. aqui em casa bem, está tudo bagunçado. eu quero dizer. é normal, acontece nas melhores famílias. isso de a casa estar com cada coisa separadinha em seus lugares devidos. como não somos bem uma família, aqui-lá está tudo mesmo mexido e com poeira e com medo. eu queria que ela comprasse um cachorro. mas ela outra tem alergia. eu queria que a gente comprasse um pai. mas elas ambas temem os homens, apesar de eu amar. não sei mais o que fazer. precisava de um livro, para fazer de travesseiro. não aguento mais ficar caído dentro dessa cadeira esperando o moço vir consertar. tenho medo que o orçamento fique caro e que uma delas não queria quebrar o porquinho. o porquinho é o nosso bem mais precioso. ele está todo remendado. mas foi por causa dos terremotos antigos. aqueles da época em que eu nem era crescido, da época em que eu era assim, solto ao mundo, largado, feito pano de chão molhado de chuva infiltrada.
 

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